segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Tempo, Carga & Luz V2 + O problema da Manutenção [upkeep]

(Tradução, com permissão do autor, do texto presente em [A], publicado em agosto de 2022)
Prince of Nothing segue com suas observações sobre os gastos de manutenção enquanto fator equilibrante no aspecto econômico da campanha, complementando junto aos fatores tempo, carga e luz, a dinâmica relacionada ao aspecto desafiador do jogo...
As diferenças entre jogos oldschool e newschool continuam sendo um tema frequente de discussão. Qualquer coisa, desde o foco em recursos personalizáveis de classe, fragilidade do personagem, geração procedural versus enredos pré-fabricados, ou interpretação versus exploração, é frequentemente citada como possível fator de distinção. Um dos pontos mais importantes que costuma ser mencionado para jogos OSR é o foco no gerenciamento de recursos. Já expliquei anteriormente que considero a interação entre carga, luz e manutenção algo de importância vital nas fases iniciais do jogo.

Infelizmente, durante minha discussão sobre o tema [B], fui astutamente superado na seção de comentários por um encontro aleatório, e apenas a ajuda oportuna do Sr. Becker, aparecendo ao amanhecer com uma hoste de Rohirrim, permitiu que o centro se mantivesse e a razão prevalecesse.

Formalmente: a crítica em relação à inclusão da manutenção no jogo foi que, no 2º nível, um guerreiro teria mais de duas mil peças de ouro à sua disposição, tornando o custo de rações, tochas e munição totalmente irrelevante.

Essa crítica provavelmente é verdadeira, se você aplicar apenas os princípios do B/X e negligenciar outros custos de oportunidade e consequências.

Brevemente, vamos considerar um caso usando o conjunto de regras revisado de Labyrinth Lord [5ª edição]. Assumimos, de forma conservadora, uma exploração de 8 horas acontecendo a cada semana. A masmorra pode estar consideravelmente mais próxima da cidade, ou podemos ter múltiplas explorações entre incursões, mas, com base na experiência pessoal, com acesso limitado a feitiços de cura, 1 semana não é um intervalo irreal.

Durante sua incursão, Bob, o Guerreiro, consome cerca de 2 pp em comida por dia¹, presumivelmente dorme em uma estalagem (precisamos estimar esse custo, que pode variar de 1 pc para o estábulo a 1 po para um estabelecimento fino, então fixamos em 1 pp). Ele gasta cerca de 2.1 po por exploração em manutenção inevitável. Presume-se que um Mestre de Jogo (MJ) perspicaz permitirá a tentativa de caçar, mas cobrará um preço em munição, encontros aleatórios e estabelecerá um nível de sucesso que torna a coleta de alimentos em área civilizada menos vantajosa do que simplesmente ficar na estalagem e comer.

Ao entrar na masmorra, Bob, o Guerreiro, precisa de luz, munição para suas armas e equipamentos variados, como cordas, cravos de ferro, sacos, espelho, etc. Composições muito estranhas compostas apenas por Elfos & Anões talvez consigam se virar sem luz, mas, assumindo que o grupo jogue D&D normal e não alguma pastiche degenerada Tolkieniana, a luz é essencial.

Para uma exploração de 8 horas, precisamos de cerca de 8 tochas ou 2 frascos de óleo para lanterna. No entanto, nem todos precisam carregar uma fonte de luz. Surge uma consideração tática quando o grupo carrega apenas uma tocha: atacar ou derrubar esse personagem em particular torna-se uma possibilidade interessante para os monstros, especialmente se o MJ decidir que há uma chance da lanterna quebrar ou a tocha apagar caso o personagem seja derrubado. De qualquer forma, algo como 1 fonte de luz para cada 4 personagens é viável. Como o Óleo é mais leve e, no fim das contas, mais barato que as tochas (por hora), assumiremos o uso de Óleo. Uma exploração de 8 horas consome 2 pp em óleo. Pela minha experiência, os Personagens tendem a gastar tochas e óleo a taxas bem mais altas, especialmente quando usados em combate, mas isso será coberto na parte de munição. Na prática, Bob gasta 2 pp/4, ou 5 pc em luz por exploração.

A munição também é um fator, e, considerando os bônus para disparos a curta distância, é uma opção taticamente muito atraente para grupos de nível baixo. Sua interpretação das regras sobre disparar em combate corpo a corpo provavelmente afetará a taxa de consumo de munição, mas, para fins deste exercício, vamos assumir 1 arma de ataque à distância por membro do grupo, e generosamente supor que ele gaste cerca de metade de sua munição em uma exploração de 8 horas. Os preços variam de gratuito² a 3 pp³ ou 5 po⁴, então adotamos uma opção intermediária: Virotes de Besta Pesada a 3 po. Acrescentamos metade do preço de um frasco de óleo, já que aventureiros consomem isso como doces; assim, 1 frasco para cada duas pessoas por exploração de 8 horas não é exagero. Bob gasta cerca de 1.55 po por exploração em munição.

Uma categoria variada de itens semi-consumíveis existe, cujo índice de desgaste depende muito das características específicas da masmorra; por isso, o custo só pode ser aproximado. Isso inclui itens como cordas, cravos de ferro, recipientes, ferramentas de escavação e assim por diante. Esses itens podem ser usados, deixados para trás ou destruídos durante a aventura. Diferentemente de fontes de luz ou munição, a taxa de uso desse tipo de equipamento cresce de forma irregular ou pouco proporcional ao número de personagens, devido à sua ampla gama de funções. Por ora, fixamos o custo por personagem em um valor ultra-conservador de 1 po de equipamentos diversos perdidos por exploração.

O custo operacional fixo total para Bob, o Guerreiro, fica então estabelecido em 6.85 po por exploração.

O quanto isso importa? Depende do número de explorações necessárias para Bob subir de nível. Quantas sessões até um personagem avançar de nível? Gygax estabeleceu isso em 6⁵; o consenso parece ser, em minha opinião, um pouco irrealista, entre 3 e 4 sessões⁶, e suspeito que, se jogarmos B/X estritamente conforme as regras [RAW: rules as written] e levarmos em conta a perda de recursos ou tesouros abandonados, esse número será mais próximo de 8. De qualquer forma, 6 explorações parece uma suposição razoável. O custo total esperado de manutenção para Bob na transição do nível 1 para o 2 é de 41.1 po.

Segundo Moldvay⁷ e confirmado neste excelente artigo [C] do Delta’s DnD, cerca de ¾ do XP vem de tesouro. Novamente, devemos considerar que os jogadores perderão uma parte do tesouro escondido em qualquer masmorra, mas, por ora, 75% parece razoável. Seguindo apenas essa proporção, Bob, o Guerreiro, pode esperar atingir o nível 2 com incríveis 1500 po no bolso, o que significa que a manutenção representaria menos de 1/30 de sua renda total, menos que um único +1 numa rolagem de d20, e, portanto, ignorá-la parece óbvio. Porém, esse é o valor máximo potencial em PO, não o realista.

Primeiro, não devemos negligenciar uma grande compra para Bob: uma armadura de placas, estabelecida na maioria das edições de D&D (incluindo LL revisado) a um valor principesco de 450 po. Em seguida, considerando que um guerreiro médio começa com cerca de 105 po (3 × um valor esperado de 3.5 × 10 po iniciais) e gastará a maior parte disso na melhor proteção possível, podemos esperar alguma melhoria de armamento, talvez de maça para espada longa, a compra de um arco longo ou besta pesada, uma arma reserva, uma adaga de prata e assim por diante. Para acomodar as variações de ouro inicial, aquisição no local e possível roubo, fixamos esse número em 25 po, o custo de uma besta pesada. Um total de 475 po entra facilmente na conta de despesas para o nível 2.

Também vale considerar um aumento de mobilidade e capacidade de carga, olhando para o preço de sela, alforjes e cavalo de montaria: meros 100.1 po que se pagam ao longo de meses, graças a viagens mais rápidas, maior capacidade de transporte e um meio mais seguro de escapar de encontros fatais no ermo. O custo extra de 1 pc/dia de manutenção é ignorado neste exemplo, embora, conforme o tamanho do grupo aumente, deva ser incluído.

Aqui, devemos nos afastar das regras escritas no LL e voltar à prática comum de OD&D e AD&D: itens mágicos são abundantes no jogo antigo. Seguindo a tendência observada em minha campanha de B2/Necropolis, não acho irreal esperar que cada personagem obtenha cerca de 2 itens mágicos por nível inicial, sem contar pergaminhos e poções degustáveis. Esses itens podem ser armaduras, escudos, adagas +1, objetos encantados menores e assim por diante. Se você permitir que esses itens sejam identificados por Sábios (como deveria!), isso representa cerca de 200 po/nível nos primeiros níveis (presumivelmente, o número de itens adquiridos por nível aumenta gradualmente à medida que o número de explorações cresce e o tesouro é ajustado para cima).

Nos níveis mais altos, podemos esperar, novamente, se seguirmos AD&D e não B/X, que os personagens gastem grandes quantias de ouro em Raise Dead, Remove Curse, Cure Disease e possivelmente Neutralize Poison. Nos níveis baixos, o custo de qualquer conjuração dessas magias é potencialmente arruinador, então é improvável que sejam usadas com frequência, se é que serão.

Assim, no nível 2 podemos esperar que Bob, o Guerreiro, tenha cerca de 775 po disponíveis, aproximadamente metade do total. O custo esperado de manutenção de 41.1 po representa cerca de 1/18 desse valor, não é esmagador, mas perceptível. Isso pode e deve ser reduzido ainda mais pelo custo de contratar e equipar seguidores, comprar boatos, subornar monstros poderosos, subornar autoridades, tributação exorbitante e possivelmente adquirir equipamentos mais exóticos como venenos, antídotos, pagar por aprendizado de feitiços ou componentes raros.

Nos níveis mais altos, a quantidade de ouro disponível tende a crescer exponencialmente, e apenas a ampla disponibilidade de magias como Raise Dead, Stone to Flesh ou possivelmente Contact Outer Plane pode evitar o colapso da economia fictícia. De fato, como o XP cresce exponencialmente nos primeiros 8 a 10 níveis, o custo total de manutenção também deve aumentar se quisermos manter a proporção entre manutenção e ouro disponível. O MJ terá bastante trabalho.

Há dois casos a considerar ao discutir o valor da manutenção como medida para fixar uma taxa contra a qual o progresso do personagem pode ser avaliado. O primeiro é o de um grupo particularmente ineficiente. Seja porque a taxa de movimento do personagem os faz ter encontros aleatórios demais, obrigando a abortar a exploração antes de obter um tesouro adequado; porque passam muito tempo encomendando equipamentos ou se preparando demais; porque a falta de cuidado os faz perder muito tesouro; ou por períodos de inatividade [downtime] causados por doença ou uso de Raise Dead;ou ainda por incompetência tática que leva a muitas retiradas ou mortes: isso pouco importa. Se Bob fizer o dobro de explorações, o percentual de recursos disponíveis que será absorvido pela manutenção mais que dobra. O custo total de manutenção dobra, e o percentual de XP obtido com tesouro diminui devido à maior frequência de encontros aleatórios normalmente pobres em tesouro, significando que haverá menos ouro quando o personagem chegar ao nível 2.

A manutenção também impõe um custo permanente à contratação de ajudantes, custo esse que se soma à perda normal de uma parte do tesouro e do XP. Normalmente, contratar ajudantes é uma troca direta entre segurança e velocidade de progresso, trocando proteção extra por uma parte do XP de monstros e tesouros. Mais uma vez, o percentual da riqueza total disponível drenado pela Manutenção aumenta, e o preço pelo progresso lento cresce na mesma medida. Ajudantes são únicos nesse aspecto, pois o peso da progressão lenta não recai sobre o NPC contratado, mas sim sobre o personagem que o contratou. Quanto mais ajudantes você tiver, mais será penalizado pela progressão lenta. Se a porcentagem de ouro disponível drenada pelo progresso lento for de 1/9 no nível 1 normalmente, esse percentual com dois ajudantes adicionais sobe para cerca de 1/3. Certos fatores, como munição, talvez não aumentem proporcionalmente ao número de ajudantes, já que lutar em túneis com fontes de luz limitadas pode restringir o número de combatentes que conseguem agir na mesma rodada.

Devido à natureza da XP por Ouro e à ausência de XP para itens mágicos e custos de treinamento, a economia do B/X tem toda a estabilidade de um reator nuclear. É preciso ou implementar a solução bastante inteligente de conceder XP apenas para tesouros gastos de forma frívola, ou inventar novas medidas e oportunidades para que os PJs gastem dinheiro de maneira que não se traduza em um avanço mais rápido, o que resultaria em ainda mais dinheiro. Nos primeiros níveis, a Manutenção funciona como um bom quebra-molas. MJs que desejam manter o ritmo de um custo fixo fariam bem em implementar algum tipo de custo de vida que aumente conforme o nível do personagem, representando um padrão de vida mais elevado. E, se jogarem ACKS, provavelmente já fazem isso.

Em resumo, proponho que a solução para as características quase vestigiais de manutenção no B/X não seja eliminá-los completamente, mas sim implementar toda uma série de outros procedimentos para que os jogadores permaneçam enxutos, famintos e motivados a progredir. Para todos os MJs novatos por aí: boa sorte, vocês vão precisar.

Atualização: para esclarecer, o efeito do ouro perdido devido a explorações lentas e ineficientes deve ser perceptível nos primeiros níveis pelo atraso na obtenção de Armadura de Placas, especialmente se o Grupo costuma juntar recursos para comprar itens e, em níveis intermediários, pode atingir proporções críticas se fizer com que os PJs fiquem abaixo do patamar necessário para pagar por feitiços como Raise Dead, Remove Curse ou Cure Disease. Morrer de fome por pobreza é extremamente raro em DnD e só ocorreria com expedições excessivamente zelosas em áreas pobres em recursos, como desertos, ou talvez por gastos excessivos seguidos de uma série de explorações desastrosas. Mesmo assim, os PJs poderiam simplesmente vender equipamentos por 50% do valor e sobreviver por meses com o dinheiro obtido. Vender itens mágicos para pagar um Raise Dead seria um último recurso nesse caso. O baixo custo de comida e abrigo implica, na prática, que isso só poderia ser um fator contributivo, e não a causa única de tal evento, a menos que o grupo seja muito grande ou extremamente ineficiente. Por exemplo, neste modelo, num grupo de 8, cada semana extra traz um custo de manutenção de 54.8 po. Comparado ao custo de um feitiço Cure Disease (500 po), tirar uma semana extra de descanso ou recuperação dificilmente causaria problemas significativos. Apenas quando um padrão de exploração descuidada e tímida se repete ao longo de várias sessões é que essa deficiência se manifestará.

Esclarecimento: assumo que uma exploração de 8 horas consome de 6 a 8 horas de tempo real de sessão, seguida por uma semana de descanso [downtime].

1. Equivalente ao custo de rações não preservadas
2. Balas de funda
3. Virotes leves
4. Aljava de Flechas
5. The Strategic Review #7, abril de 1976
6. Becker mostra como isso é inviável em níveis mais altos em https://dustdigger.blogspot.com/2025/08/d-bx-uma-falha-de-design.html [D]
7. Tom Moldvay, D&D Basic Rulebook 1981

∞ PrinceofNothing ∞

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