quinta-feira, 18 de setembro de 2025

Arbitragens, Não Regras: Um Alicerce, Não uma Falha

(Tradução, com permissão do autor, do texto presente em [1], publicado em julho de 2025)

Robert Conley em defesa do "Rulings, Not Rules" como filosofia de design...

Houve muita discussão ao longo dos anos sobre como o Dungeons & Dragons Original lidava (ou deixava de lidar) com as situações comuns que se espera em uma campanha de RPG de mesa. Coisas como pular um desfiladeiro, escalar uma parede ou convencer um guarda da cidade com lábia. A crítica geralmente se resume a: o OD&D não era completo, deixou muita coisa de fora.

O que as pessoas esquecem é que Gygax não estava escrevendo o OD&D para novatos em jogos. Ele escrevia para a comunidade de wargames do início dos anos 70, pessoas que já criavam seus próprios cenários, modificavam regras e conduziam campanhas. Seu público não buscava um sistema completo, à prova de falhas, com cobertura exaustiva. Eles queriam uma estrutura sobre a qual pudessem expandir, o tipo de estrutura que lhes permitisse conduzir campanhas como as que haviam ouvido falar, como Blackmoor ou Greyhawk.

Essa mentalidade moldou o jogo. Gygax e Arneson destilaram aquilo que funcionava em suas campanhas no OD&D, confiando que os árbitros preencheriam o resto. O que eles não previram foi o quão rápido o hobby cresceria além daquele grupo central, ou como jogadores mais novos abordariam regras e sistemas de maneira diferente.

“Arbitragens, Não Regras” [Rulings, Not Rules] é uma Filosofia de Design

Quando as pessoas falam sobre “arbitragens, não regras”, às vezes colocam isso como um remendo, algo que você faz porque o jogo não cobriu o suficiente. Eu não vejo dessa forma. Vejo como uma escolha de design deliberada.

Uma campanha que começa apenas com uma masmorra e uma vila não está “incompleta”. É um ponto de partida. A suposição era de que o árbitro e os jogadores construiriam juntos a partir dali. O jogo não foi feito para te entregar um mundo totalmente realizado e mecanizado; ele foi feito para te dar uma estrutura para criar o seu próprio.

OD&D Funcionava por Causa das Lacunas

Pelos padrões modernos, o OD&D tem “lacunas”. Mas essas lacunas nem sempre eram acidentais. Elas existiam porque Gygax sabia que seus leitores já tinham os hábitos e a mentalidade para preenchê-las. Árbitros de wargames sabiam como julgar situações inusitadas, porque era isso que vinham fazendo há anos em suas mesas de areia.

O que hoje parece uma omissão muitas vezes era apenas uma suposição silenciosa: “É claro que o árbitro vai lidar com isso.”

É por isso que o OD&D deu origem a tantas campanhas variantes. Não havia um texto sagrado, nem um cânone, era uma cultura de iteração. Experimentar algo, ajustar, manter o que funciona. Esse era o DNA do hobby nos primeiros tempos.

O Problema Quando o Hobby Cresceu

Foi aí que as coisas começaram a desandar. O OD&D não ensinava o processo de fazer arbitragens. Quando o jogo se espalhou além dos wargamers, essa falta de orientação se tornou um problema real.

Pegue o exemplo de pular um desfiladeiro. Um árbitro de wargame em 1974 talvez pesquisasse os recordes olímpicos de salto, considerasse os atributos do personagem, o equipamento que ele carregava, o terreno, e improvisasse uma decisão com base nisso. Isso era normal.

Mas para um jogador ou árbitro totalmente novo em 1977? A mesma situação podia se transformar em um beco sem saída frustrante. Não havia um referencial comum sobre como pensar a questão, então as decisões pareciam arbitrárias ou, pior, como se os números tivessem sido tirados do nada.

Orientação e Aconselhamento

O hobby em seus primórdios teria se beneficiado mais se ensinasse como fazer arbitragens, e não apenas listasse regras. Orientar os iniciantes no processo de lidar com situações novas e formular decisões, tanto em termos gerais quanto usando as mecânicas do próprio designer, teria sido muito útil.

Isso não é difícil de fazer, e não compromete o estilo aberto que tornou o D&D inicial tão criativo. No meu Basic Rules for the Majestic Fantasy RPG, escrevi um capítulo chamado "Quando Fazer uma Arbitragem" [When to Make a Ruling] [2] para abordar exatamente essa questão, usando as mecânicas do Majestic Fantasy RPG. Pretendo expandir esse conteúdo (e outros) quando concluir a versão completa.

Regras Básicas para o Majestic Fantasy RPG [3]

Arbitragens Não São um Recurso Emergencial — São o Propósito

Os entusiastas não estão errados por querer mais estrutura. Jogos como GURPS, Fate, Burning Wheel ou Mythras oferecem amplo suporte pronto para uso, e isso é valioso.

Mas aqui está a verdade: até mesmo esses sistemas eventualmente esbarram em casos extremos, situações esquisitas, novos cenários ou algo que as regras simplesmente não cobrem. Quando isso acontece, você precisa da mesma ferramenta que o OD&D presumiu desde o início: a capacidade de fazer uma arbitragem.

E é por isso que “arbitragens, não regras” não é apenas um slogan ou uma desculpa para conteúdo ausente. É a base de como o RPG de mesa foi originalmente pensado para funcionar.

O que precisamos daqui para frente é de mais orientação e menos prescrição por parte dos designers. Se você entrega a um árbitro uma Classe de Dificuldade, ele tem o que precisa para lidar com aquela situação específica. Mas se você o ensina a fazer arbitragens junto com as Classes de Dificuldade, ele ganha uma habilidade que pode aplicar em toda campanha que conduzir a partir daquele momento.

Porque regras te dão ferramentas, mas arbitragens te dão engenhosidade [craft] e é essa engenhosidade que faz as campanhas de RPG de mesa realmente ganharem vida.

∞ Robert Conley ∞
∴ 

1. https://batintheattic.blogspot.com/2025/07/rulings-not-rules-foundation-not.html
2. https://drive.google.com/file/d/1592Ia9Y4Ucp9TjxoZR5oOTRObzsKtOtC/view?usp=sharing
3. https://www.drivethrurpg.com/en/product/337515/the-majestic-fantasy-rpg-basic-rules 

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