sábado, 24 de agosto de 2024

O que é Classic Adventure Gaming (CAG, Jogo de Aventura Clássico)?

(Tradução, com permissão do autor, do texto presente em [1], publicado em julho de 2024)


Classic Adventure Gaming (Jogo Clássico de Aventura) [2] não é um jogo de interpretação de papéis [3]. Não é OSR (Old School Renaissance/Revolution), mesmo que utilize livros de regras que o OSR também reivindica. É o estilo de jogo presumido e apresentado no PHB (Player Hand Book, ou Livro do Jogador) e DMG (Dungeon Master Guide, ou Guia do Mestre de Masmorra) da 1ª edição (D&D 1e), que era comum antes que um estilo de interpretação de papéis se tornasse a norma. Ele rejeita o termo "jogo de interpretação de papéis" ou "RPG" porque hoje esses nomes transmitem expectativas implícitas que contrariam as práticas de um jogo de aventura bem-sucedido.

Começamos com o que o Adventure Gaming não é, para já tirar da cabeça pressuposições inúteis, antes de explicar o que ele de fato é. (Para uma segunda excelente opinião sobre o assunto feita pelo meu colega Zherbus, veja seus pontos em seu blog [4]; para os pontos de JB sobre jogos de aventura com os vários conjuntos de regras 'B', veja sua postagem [5] sobre esse tópico.)

Classic Adventure Gaming prioriza o seguinte:

• Os jogadores e o GM (Game Master ou Mestre do Jogo) estão fundamentalmente interagindo uns com os outros, como pessoas ao redor de uma mesa (virtual ou não), não como controladores de PCs (Player Characters ou Personagem do Jogador) e NPCs. (Non Player Characters ou Personagem do Mestre). Nenhum jogador é obrigado ou esperado a substituir sua própria personalidade na mesa em prol de uma fictícia.

• Espera-se que os jogadores melhorem no jogo e demonstrem um domínio crescente de suas habilidades para com as regras. Se alguém está jogando com seu décimo personagem de 1º nível de maneira semelhante a como jogou com seu primeiro personagem de 1º nível, algo está errado.

• Não há expectativa de que os jogadores ajam na mesa como se um jogo não estivesse ocorrendo; espera-se que os jogadores usem o que o hobby moderno erroneamente despreza como “metagame” - e que seu uso não seja desencorajado. Um jogador que sabe que o fogo impede os trolls de se regenerarem, mas se recusa a usá-lo porque “meu personagem não sabe disso”, está interpretando um papel em vez de jogar uma aventura.

• Por outro lado, os GMs não devem usar metagame – porque um GM tem conhecimento perfeito de seu mundo fictício, eles devem se limitar ao conhecimento, objetivos, habilidades, recursos e peculiaridades do NPC ou monstro que estão controlando no momento, para que um jogo funcional ocorra. Isso é quase o oposto exato de como a maioria dos jogos de interpretação de papéis vê a dinâmica entre jogador e GM além de um exemplo de como a interpretação de personagens mudou o estilo de jogo radicalmente em relação a como os jogos eram jogados inicialmente.

• O Adventure Gaming é baseado em campanhas; a ideia de jogos one-shot (sessão curta de uma vez só) é estranha a esse estilo de jogar. Um mundo de jogo existe e persiste independentemente de qualquer grupo de personagens. Quando combinado com a expectativa de que os jogadores cresçam no domínio de um conjunto de regras, um único conjunto dessas regras é usado por longos períodos de tempo (se não indefinidamente), para que os jogadores ganhem tempo suficiente para entendê-lo completamente, em vez de superficialmente.

• Pelo fato do GM estar confortável com jogadores altamente experientes, a modificação de regras feita apenas por modificar, ou talvez apenas para reintroduzir artificialmente uma atmosfera de incerteza ao jogador, devido à sua ignorância, é desencorajada. Os GMs escolhem conjuntos de regras com os quais já concordam com os princípios básicos e pressupostos do autor, para que todos possam continuar jogando. O jogo de nível alto é abraçado e esse deve ser o objetivo de toda campanha.

• Ninguém está tentando contar uma história. Um GM cria lugares e situações; se um futuro é determinado, é o futuro do que acontecerá naquele local ou com aqueles NPCs se os jogadores decidirem não interagir com eles. Nenhuma tentativa é feita para predeterminar o curso do que acontecerá se os jogadores decidirem interagir com aquele conteúdo. Se o GM determinou os objetivos, recursos, habilidades, geografia local e “personalidade” de qualquer NPC em um determinado lugar, eles já têm todas as ferramentas necessárias para reagir de forma crível e distinta a quaisquer ações ou planos que os jogadores possam elaborar no momento do contato.

• Se os planos e sorte dos jogadores resultarem em determinado desfecho em comparação com as preparações e habilidades da oposição, eles podem “vencer” situações de maneira convincente e sem a necessidade de tensão ou perigo artificiais impostos pelo GM. Por outro lado, o jogo é generoso com a mágica que dá segundas oportunidades, então o GM não precisa impedir que planos ruins e jogadas fracas causem tempestades (tenham consequências desastrosas).

• A agência do jogador é primordial. O ônus de qual curso de ação será tomado está nos jogadores, não no GM. O Adventure Gaming não combina bem com uma mesa composta inteiramente por jogadores passivos, independentemente de quão empolgado um GM possa estar em tentar. Muita frustração ocorre quando um GM tenta executar um jogo de aventura com jogadores que desejam que o GM dite o que eles estarão fazendo naquela noite, com os jogadores tomando mínimas decisões durante a partida e querendo ter sucesso no objetivo que o GM apresentou. O Adventure Gaming é feito especificamente para grupos que têm no mínimo um jogador que gosta de tomar decisões. Nem todos precisam ser tomadores de decisões se o resto do grupo estiver confortável em permitir que uma minoria desempenhe o papel que um GM  tipicamente desempenha em campanhas típicas de RPG, decidindo qual será o curso de ação do grupo para uma sessão de jogo.

• Um GM aceita que a construção do mundo e a criação de locais/cenários é um hobby paralelo, mas separado do próprio jogo. Os GMs desfrutam da construção do mundo por si só. Não há sensação de que o tempo gasto elaborando locais e NPCs é “desperdiçado” se os jogadores não interagirem com eles. Em vez disso, o GM determina as consequências dos jogadores não interagirem com aquele conteúdo, o mundo do jogo vai mudando e isso mostra aos jogadores que ele se move mesmo quando eles não intervêm pessoalmente.

• À medida que os jogadores desenvolvem seu domínio do conjunto de regras, o ritmo do jogo se torna muito mais rápido do que a maioria dos grupos de jogos de interpretação de papéis experimenta em mesa. O ideal que todos os participantes estão almejando é um ritmo que se aproxima de um jogo de pingue-pongue, onde o GM está entregando informações aos jogadores que agem ou reagem rapidamente a elas, sem negociações sobre as informações recebidas.

• Ao contrário de muitos RPGs, personagens de 1º nível não têm um feitiço de parar o tempo de 9º nível que podem usar a qualquer momento que preferirem para ter mais informações na tomada de decisão. Todos aceitam que algumas decisões terão resultados menos do que ideais porque o jogo continua avançando sem tempo para refleti-las se as circunstâncias não estão inteiramente sob o controle dos PCs. Mas isso resulta em mais exploração, mais encontros e avanços mais rápidos no agregado do jogo.

• O Adventure Gaming não é uma atividade com poucos tesouros, onde “magia é rara e maravilhosa”. Jogos “mudcore", como personificados por jogos de “realismo” de poucos recursos, como HARN, são incompatíveis tematicamente com os jogos CAG. A agência do jogador requer recursos amplos, e o GM não se intimida com jogadores que crescem rapidamente em riqueza, poder e independência à medida que o jogo inicial é deixado para trás. Os jogos iniciais são leves em poderes de classe de personagem embutidos porque se espera que o PC tenha vários itens mágicos que dão uma gama de “poderes de personagem” que mudam com o tempo à medida que os itens são usados (ou destruídos) e substituídos por novos e diferentes itens.

Esses princípios são todos encontrados no PHB e DMG da 1ª edição (e recomendo fortemente as formas avançadas do jogo para uso com ele), embora tenham saído de moda à medida que um número maior de entusiastas mais confortáveis com a interpretação de papéis do que com jogos rigorosos, entrou no hobby. O Adventure Gaming extrai esse estilo inicial e o separa do estilo mais comum praticado hoje, que abertamente desencoraja muitos elementos que o tornam eficientes. Não é para toda mesa ou grupo, mas para aqueles que se encaixam nesse estilo, é insubstituível. Se você e seu grupo veem uma atividade nas páginas do livro que o jogo nunca parece capturar completamente (e você deseja que capture), tente rodar uma campanha baseada nesses princípios e veja se o jogo se torna mais agradável e envolvente.

∞ EOTB ∞

1. https://csio.blogspot.com/2024/07/what-is-classic-adventure-gaming.html
2. https://podcasters.spotify.com/pod/show/tcagp/episodes/Fundamentals-of-Fantasy-Adventure-Gaming-e1sqsec
3. https://dustdigger.blogspot.com/2024/08/sem-interpretacao-de-papeis.html
4. https://dustdigger.blogspot.com/2024/08/explicando-o-que-os-jogos-de-aventura.html
5. https://dustdigger.blogspot.com/2024/08/jogo-de-aventura-basico.html

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